Advogados do Distrito Federal e do Entorno formaram um grupo em aplicativo de mensagens para prezar pela “defesa masculina”. Com o nome “homens pela justiça”, eles alegam que pretendem revisar decisões judiciais que causem prejuízo aos homens.
Na descrição, o grupo diz que a figura masculina passa por injustiças em processos criminais, como em casos envolvendo a Lei Maria da Penha, em casos de guarda e de alimentos (leia abaixo a descrição).
“Isso é uma vergonha”, disse um advogado que foi adicionado involuntariamente no grupo. Com o teor do convite, ele levou o caso ao conhecimento da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF).
“Ao me deparar com o convite, cheguei a pensar que seria um grupo de proliferação de fake news sexistas, pois era o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres. Para minha surpresa, logo verifiquei que, realmente, trata-se de grupo que já conta com a participação de centenas de advogados (inclusive reconheci um presidente de subseção da OAB e um professor de Direito)”, declarou o advogado.
“Quando me posicionei surpreso e indignado com o tema proposto, fui removido logo que enviei a primeira mensagem. Isso demonstra que aquele debate é, além de tudo, manifestamente antidemocrático, o que fere de morte os princípios que regem a advocacia”, concluiu. O grupo reunia 232 pessoas.
O movimento é polêmico já que o direito a uma ampla defesa e ao contraditório é garantido a todas as pessoas, sem divisão de homens ou mulheres. Além disso, há a preocupação de que o grupo minimize ou justifique supostos comportamentos abusivos.
“Essa perspectiva de demonizar qualquer direito para proteger as mulheres é um traço de masculinidade tóxica que não consegue entender que todos têm direitos”, disse a presidente da Comissão da Mulher Nildete Santana de Oliveira.
Leia também
“Essa masculinidade frágil faz florir no imaginário dos homens que as mulheres estão ferindo o direito deles”, detalhou Nildete. “O devido processo legal tem princípios já estabelecidos, como o direito ao contraditório e à ampla defesa. Isso não é um privilégio do homem ou da mulher”, reforçou.
Imagem tirada de livro
O grupo usa como imagem de referência a capa de um livro que ensina ética masculina no aspecto jurídico. A obra destaca ações que, segundo o texto, todo homem deve seguir. Uma delas é fazer exame de DNA em todos os filhos, para se certificar que está realmente criando descendentes legítimos.
Em outro ponto, o livro orienta que o homem prove ter mais condições financeiras que a esposa em processos de guarda para garantir a tutela de crianças. Apesar de o livro usado como símbolo pelo grupo dar dicas jurídicas do conteúdo, o administrador do coletivo masculino afirma que a imagem não tem relação e que é mudada todas as semanas.
O grupo é administrado pelo advogado Douglas Santos, professor de direito de uma faculdade particular do Distrito Federal e relator da OAB-DF. O grupo ainda conta com a participação de Manoel Da Cruz Da Silva, presidente da OAB na subseção de Águas Lindas de Goiás, no Entorno do Distrito Federal.
Em conversa, Douglas destacou que o grupo funciona como uma conversa de bar, mas pelo celular, e que há profissionais de diversas áreas. Para ele, a justiça favorece as mulheres e o grupo teria o suposto objetivo de equilibrar a balança.
“A nossa luta é justamente para termos um processo verdadeiro e justo ao homem, bem como defender o direito das mulheres verdadeiras que necessitam da Justiça”, destacou em entrevista.
Ele negou que o grupo possa minimizar agressões e situações de abusos contra o sexo feminino. “O que nós mais defendemos são as mulheres, mas as mulheres de bem e verdadeiras”, alegou.
O Metrópoles também conseguiu contato rápido com o presidente da OAB de Águas Lindas, mas Manoel da Cruz disse que pegaria a estrada e não poderia responder. O espaço segue aberto caso queira se manifestar sobre o assunto.
A secção de Goiás da OAB (OAB-GO) disse desconhecer qualquer movimentação do tipo para poder comentar. Questionada sobre a participação ativa do relator da OAB-DF, a ordem não respondeu até o momento.
A reportagem também tentou contato com a Faculdade Mauá, mas não conseguiu retorno da instituição de ensino.
Leia descrição de grupo:
“Nosso objetivo é analisar e procurar soluções para as injustiças causadas contra a figura masculina. Isso visa verificar as decisões judiciais, administrativas e legislativas que causam prejuízos aos homens sem que haja um contraditório, ampla defesa e um equilíbrio entre as parte envolvidas (sic).
Entendemos que os direitos das mulheres, das crianças, dos idosos e etc, devem sempre ser garantidos, todavia, deve-se também olhar para a figura masculina que em muitos casos passa por injustiças em processos criminais, de lei Maria da Penha, de guarda, alimentos e etc.
Nossa causa é para melhorar o direito e não retirar o direito de ninguém, bem como melhorar a figura do homem perante a sociedade, tornando o homem um melhor companheiro, filho, pai e etc, orientando como agir em determinada situações [sic], como cuidar da sua saúde e cuidar da família.
Não temos nenhum vínculo político ou partidário.
Sejam bem-vindos”