Médico da família e da comunidade, Octávio Milton Saquicela Siquenza, 65 anos, seria conhecido na Unidade Básica de Saúde (UBS) 5 do Gama por importunar sexualmente de várias pacientes da unidade. O profissional, denunciado por ter arrancado a blusa de uma enfermeira, também é acusado de apalpar pacientes durante consultas, além de ter fama de facilitar encaminhamentos para alvos de suas investidas amorosas.
Ao Metrópoles uma paciente relatou que teve os seios apalpados pelo médico de forma indevida, enquanto lhe ouvia os batimentos cardíacos com um estetoscópio. “O tempo todo ele me elogiava, me chamava de linda. Quando eu voltei com os exames, eu o repreendi e disse que não gostava daquilo. E o comportamento dele mudou completamente”, disse a vítima, que preferiu não se identificar.
Segundo a paciente, dois dias depois da consulta a dor que ela sentia ao procurar a UBS persistia, e ela pediu que uma conhecida, que também é da área da saúde, olhasse os exames levados ao médico anteriormente. “Ela disse ‘está claro que vocês está com uma infecção urinária. Como o médico não viu isso?’. E então eu fui a outro profissional, e precisei passar três dias seguidos tomando injeção”, completou.
A mulher relatou, por fim, que até chegou a voltar à USB afim de denunciar a atitude do médico para a recepção, mas que logo foi desencorajada pelo profissional que a atendeu.
Uma outra moradora da região também comentou sobre a postura do médico, de fazer investidas impróprias às pacientes que procuram a unidade de saúde. “Ele gosta, principalmente, das ‘mais bonitas’. Aí, para elas, é só ir até o doutor Octavio que ele passa de tudo: receita, encaminhamento, o que for”, disse.
Uma gerente de serviços de atenção primária de outra UBS do Gama também denunciou o comportamento do médico. Além dos assédios e importunações sexuais, ela mencionou outras situações envolvendo o profissional, como faltas constantes e uma série de comentários racistas e pejorativos com os pacientes.
Servidoras e pacientes do médico já protocolaram denúncias junto ao Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF). A instituição afirmou, em nota (leia abaixo), que investiga internamente os relatos recebidos.
Após esse posicionamento, a gerente da UBS do Gama relatou ter sido alvo de uma série de ameaças por parte da diretoria de atenção primária à saúde da Região Sul, como a demissão de funcionários terceirizados. Ela foi exonerada do cargo em novembro último.
Assédio a enfermeira
Além das pacientes, uma enfermeira, que há cinco anos trabalhava diretamente com Octavio Milton, levou à Superintendência da Regional Sul – responsável pela administração das unidades de saúde do Gama e Santa Maria – uma denúncia, na qual descreveu ter sido, por meses, alvo de assédios e comentários de cunho sexual por parte do médico.
As investidas teriam se tornado físicas, após o médico ter arrancado a blusa da enfermeira e, em outra ocasião, a puxado de forma brusca pelo braço enquanto ela andava por um corredor. O processo corre internamente, na Secretaria da Saúde do Distrito Federal (SES-DF).
O caso também foi registrado na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam I), que investiga a denúncia.
“Desde o início do ano, ele iniciou abordagens que evoluíram para importunações sexuais e tentativas de invasão de minha privacidade, como envio de presentes, cartas e exposição de minha imagem em redes sociais com conotação pejorativa. Em um um plantão na UBS 7 Gama fui abordada por um técnico administrativo cantando a música ‘Festa no apê’, do Latino. Ao questiona-lo, ele relatou: ‘Não viu o Instagram do Dr Octávio com sua foto e essa música?’. Fui para os atendimentos sem reação, constrangida” detalhou a profissional na denúncia.
“Em uma ocasião, enquanto estava deitada na maca da sala que trabalho devido a uma gripe forte, ele se aproveitou do momento para levantar minha blusa sem minha permissão, expondo-me de forma constrangedora e invasiva. Posteriormente, ele relatou o ocorrido para outros servidores. Um deles, inclusive, me procurou para comentar que o doutor teria me apalpado, o que me causou ainda mais temor e constrangimento”, completou.
Servidores da UBS 5 do Gama manifestaram contra assédios cometidos por médico da unidade
Outro caso de assédio na unidade também foi relatado à reportagem. Octavio teria tentado levar a boca ao seios de uma outra servidora da unidade. Por medo de sofrer represálias por parte da gerência da unidade, a vítima não apresentou denúncia à SES ou à polícia.
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Pronunciamentos
Acionada pelo Metrópoles, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) informou, por meio de nota (leia abaixo na íntegra), que a movimentação para a outra unidade teria sido realizada “em comum acordo com a servidora”, e que o médico dito como autor do assédio teria sido temporariamente movido para uma terceira unidade até a conclusão da investigação dos fatos narrados.
A reportagem apurou, ainda, que um documento apresentado a servidores da UBS 5 do Gama, ao qual o Metrópoles teve acesso, teria informado que o médico Octavio Milton seria transferido para a UBS 13 do Gama: uma unidade rural que não conta com ponto eletrônico para registro de presença dos servidores.
Em nota, a SES-DF negou a transferência do servidor para a unidade informada e afirmou que a movimentação do médico será efetuada apenas quando ele terminar o cumprimento de uma licença médica.
O médico Octavio Milton alegou à reportagem que estaria sendo vítima de calúnia e negou todas as acusações.
Leia nota do médico:
“Conheço a enfermeira envolvida há 6 anos. Temos um bom relacionamento de trabalho. E por algum motivo ela começou a falar mal de mim, começou a me atacar e começou a pedir que pacientes falassem mal de mim. Como tínhamos um bom relacionamento, nós íamos a lojas, eu a comprava presentes, a convidava a festas, mandei arrumar o carro dela. Um dia a gerência da unidade de saúde perguntou se ela já foi cantada por mim e ela respondeu que nunca. Mas que ela começou a me atacar porque há dois meses foi afastada da unidade e porque ela me devia dinheiro. Então ela inventou essas mentiras pois o assédio sexual é a forma mais grave para manchar a moral de um homem. A enfermeira em questão tem um grande histórico de brigas, tem muitos processos contra ela. Eu conheço a moral dessa enfermeira, conheço a minha moral e posso dizer que todos esses fatos se tratam de mentiras.”
Leia na íntegra a nota da Secretaria da Saúde (SES-DF):
“A Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) informa que não compactua com nenhuma forma de assédio. O caso em apuração envolve uma enfermeira e um médico de uma mesma equipe de uma unidade básica de saúde do Gama. Inicialmente, o fato foi reportado como conflito interpessoal entre servidores. Foram feitas tentativas de mediação de conflito com ambos, sem sucesso. Dias depois, foi apresentada pela servidora uma denúncia que envolveu acusação de assédio.
A gestão imediatamente levou o caso para apuração pelas unidades competentes, no âmbito da Secretaria de Estado de Saúde do DF, em processo sigiloso. Em comum acordo com a servidora, foi iniciado um processo para a movimentação da mesma para outra região de saúde. Quanto ao médico envolvido, que encontra-se em afastamento legal, foi realizada uma movimentação temporária para uma unidade de saúde no Gama, até que se conclua a investigação dos fatos narrados, pelos órgãos competentes”.
Leia na íntegra a nota do Conselho Regional de Medicina (CRM-DF):
“O CRM-DF repudia quaisquer atos de violência contra mulher e contra os profissionais de saúde em exercício da sua função.
O CRM-DF investiga todas as denúncias recebidas diretamente pelo Conselho, assim como notícias de fato divulgadas na imprensa, por meio da instauração de sindicâncias. Caso sejam constatados indícios de infração ética, poderá resultar em processo ético-profissional.
Ressaltamos que todos os procedimentos tramitam sob sigilo processual, conforme determina a legislação vigente.”