Nenhuma região do Distrito Federal registrou mais ocorrências policiais entre síndicos e moradores de condomínios do que Águas Claras. De 2019 para cá, a cidade contabilizou 82 conflitos entre administradores e condôminos. O número é maior do que os dados de outras 12 regiões juntas.
No recorte 2019-2024, os anos em que Águas Claras mais teve ocorrências entre síndicos e condôminos foram 2020 e 2022, com 17 boletins registrados cada. A região tem tudo para bater o recorde em breve, porque 2024 já alcançou esse número apenas no período entre janeiro e outubro.
Daniel Ferreira/Metrópoles
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Vinícius Schmidt/Metrópoles (@vinicius.foto)
O Plano Piloto é a segunda região com mais brigas entre síndicos e vizinhos, tendo 80 casos no mesmo período citado anteriormente. Em terceiro lugar vem Taguatinga, com 38 ocorrências — menos que a metade das outras duas cidades.
Em contrapartida, 10 regiões administrativas somaram menos de 10 ocorrências nos últimos seis anos. São elas: Ceilândia (8), Sol Nascente/Pôr do Sol (7), Arniqueira (6), Lago Norte (5), Sobradinho (4), Núcleo Bandeirante (4), Lago Sul (3), Itapoã (3), Planaltina (1) e Recanto das Emas (1).
O gráfico abaixo mostra, em ondas, as regiões com mais casos e o retrospecto ano a ano. Veja:
Os números são da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), obtidos pelo Metrópoles via Lei de Acesso à Informação (LAI). Os dados de 2024 vão apenas até outubro.
A corporação traz também dados sobre as naturezas criminais dos conflitos síndico x morador. Difamação é a causa campeã, com 165 casos; depois, vem injúria, com 158; calúnia, com 123; e ameaça, com 114. Lesão corporal dolosa, vias de fato e tentativa de lesão corporal completam a lista. Essa última tem apenas duas ocorrências nos últimos seis anos.
Confira no gráfico:
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O residencial Atol das Rocas, na Avenida das Castanheiras, foi um dos grandes responsáveis pela alta de casos em Águas Claras em 2024. Foram registrados pelo menos nove boletins contra o síndico, o servidor público Cláudio Araújo Caetano, 53 anos. Os moradores relatam que Cláudio os persegue e faz vídeos deles sem autorização. Ele, em contrapartida, diz que é a verdadeira vítima por ter, supostamente, desarticulado uma “quadrilha envolvendo empresas de engenharia, prestadores de serviços”, entre outros. O servidor também foi à PCDF registrar ocorrência. Há ainda diversos processos judiciais em tramitação.
Em abril de 2022, um síndico de 60 anos levou golpes de mangueira de uma moradora. Wladimir Lyra dos Santos disse ao Metrópoles à época que estava aguando plantas quando a suspeita tomou a mangueira das mãos dele e lhe agrediu nas costas. “Durante o ataque, ela me xingou e pediu que eu não a incomodasse mais. Eu só protegi a minha cabeça. Não revidei”, contou Wladimir. A mulher não se manifestou.
Um mês antes, o síndico do residencial Luna Park, na Quadra 301, levou um soco e foi ao chão após discutir com um morador. A vítima, o jornalista Wahby Khalil, sofreu a agressão após se desentender com um vizinho sobre um saco de boxe da academia coletiva. Khalil registrou ocorrência, mas preferiu não expor o nome do acusado à época.
Maior densidade populacional
Águas Claras concentra cerca de 14.074 pessoas por km². De acordo com os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a RA tem a maior densidade populacional do DF.
A densidade populacional é definida pela relação entre a população e a área do território. Segundo o Censo 2022 do IBGE, Águas Claras tem uma área de 9,1 km² e 128,4 mil moradores.
Síndicos são “tanto vítimas quanto culpados”
A Associação dos Síndicos de Condomínios Comerciais e Residenciais do Distrito Federal (AssoSíndicos-DF) considera que os síndicos são vítimas da violência, mas também tem culpa na alta de ocorrência. “No entanto, os moradores exigem mais do que deveriam e, muitas vezes, pedem coisas que não são atribuições do síndico”, considera o presidente da entidade, Emerson Tormann.
Para Tormann, o fato de Águas Claras ser a região mais problemática no relacionamento entre síndico e morador está ligado ao poder aquisitivo das pessoas que lá vivem. O presidente acredita que as pessoas têm um entendimento que o líder do condomínio é, na verdade, um funcionário.
“Esse tratamento dado ao síndico, como se fosse um empregado dos moradores, é geralmente o causador destes embates. Além disso, por mais que os moradores se considerem de maior poder aquisitivo, estão sempre reclamando dos valores da taxa condominial e atribuindo os aumentos à má gestão do síndico. Isso, mais uma vez, gera conflitos.”
Na visão de Tormann, a “movimentação conturbada” de regiões como Águas Claras, Taguatinga e Plano Piloto contribuem para as intercorrências. “São pessoas que se estressam mais por conta de uma posição social. Isso desencadeia uma situação de estresse que é diferente das outras regiões que não sofrem tanto com isso”, acredita o líder da AssoSíndicos-DF.
“Outro ponto a se considerar é que regiões como Ceilândia, por exemplo ,que tem uma população muito maior, acaba resolvendo esses casos sem o registro de ocorrência. Conheço vários condomínios no Itapoã e em Sobradinho, por exemplo, que têm histórias de conflitos com síndicos e moradores que não viram notícia”, pontua Emerson Tormann.
Por fim, o presidente da AssoSíndicos-DF diz que o órgão tem ciência dos casos de conflitos. “Em nossos cursos, temos palestras de relacionamento interpessoal e linguagem não-violenta para síndicos. Além disso, promovemos encontros e campanhas de conscientização para o bom relacionamento e o bem-estar dos moradores e síndicos”, encerra Tormann.